08/06/2013 07:58 |
O Conselho Nacional de Direitos da
Mulher (CNDM) vem elaborando um documento com argumentos contrários a um
projeto de lei que prevê a criação do Estatuto do Nascituro. O
regulamento quer classificar que um embrião já é um ser humano desde sua
concepção, e que ele tem direitos como qualquer pessoa, mesmo que ainda
não tenha nascido. A proposta também estabelece que toda mulher que
engravidar devido a um estupro terá direito a uma pensão alimentícia,
garantida pelo estuprador ou pelo Estado.
Segundo um dos autores do projeto, o ex-deputado Luiz Bassuma - à época
no PT-BA, hoje filiado ao PMDB-BA -, "o principal objetivo é como se
fosse regulamentar o artigo 5º da Constituição (que garante o direito à vida),
deixando claro que a vida começa no momento da concepção". "Então, o
direito fica assegurado a partir daí, para que não haja nenhuma dúvida
em relação a qualquer outra ação que possa levar ao aborto", disse
Bassuma.
O relatório preparado pelo CNDM deve ser entregue ao Congresso Nacional
e a vários setores da sociedade. O objetivo é convencer a população - e
principalmente os parlamentares - de que o projeto é um "retrocesso" em
relação aos direitos da mulher já conquistados no País.
De acordo com a professora Lucia Rincon, integrante do CNDM e membro da
União Brasileira de Mulheres (UBM), o Conselho se opõe principalmente à
"criminalização do abortamento, em particular à criminalização daqueles
(abortos) que são permitidos em lei". "É um projeto que agride os direitos já adquiridos, inclusive de (aborto em caso de) risco de vida, em caso de estupro", disse Lucia.
A proposta não altera o Código Penal, que prevê que a mulher tem
direito a realizar o aborto quando a gravidez é resultado de estupro,
quando causa risco à vida dela ou quando o feto tem anencefalia. No
entanto, para o CNDM, o projeto busca restringir o direito que a mulher
tem de fazer escolhas sobre o próprio corpo. "Quem, de fato, tem que
decidir a situação em relação ao seu corpo é a mulher. Em particular em
casos de estupro, que é o objeto do projeto. Nesse caso, nós já
conquistamos uma legislação antiga, então é um retrocesso enorme",
disse
O ex-deputado discorda, e afirma que a mulher não pode fazer escolhas
sobre o próprio corpo enquanto está grávida. "A mulher tem direito sobre
seu corpo, só que esse corpo que está, durante alguns meses, gestando,
ele não é mais propriedade dela, ela não pode matar essa vida. Isso é
superior a ela. Ela pode ter o direito, sim, de evitar a gravidez",
disse Bassuma.
"Aquele ser não é propriedade dela, ela não tem o direito de 'matar', é
um novo ser vivo. Está acima disso. E eu não uso mais a palavra nem
embrião, nem feto. Sempre é criança, porque não vai nascer uma
tartaruga, não vai nascer um pato, vai nascer um ser humano, e é um ser
humano desde esse momento, da concepção, tem que ser protegido. Se a mãe
não quer esse filho, tem que ir para a adoção", argumenta ele.
Pensão alimentícia a crianças fruto de estupro
O projeto também prevê que mulheres que engravidarem vítimas de violência sexual recebam uma pensão alimentícia - paga pelo pai, o estuprador, ou pelo Estado caso o agressor não seja identificado. O ponto é um dos mais polêmicos da proposta, já que apresenta uma contradição: se o autor da agressão tiver que pagar a pensão à criança, ele deve ser reconhecido em cartório como pai dela. Isso dá ao estuprador direitos de paternidade - inclusive, por exemplo, a possibilidade de ter a guarda da criança.
O ex-deputado Luiz Bassuma diz que isso não aconteceria, e que o agressor só teria a responsabilidade de pagar a pensão. "(Fica a cargo do estuprador)
a responsabilidade financeira, nunca a responsabilidade paterna no
sentido de assumir paternidade - isso, não. Porque ele é um criminoso,
ele vai responder pelo crime. Agora, além de responder pelo crime, ele
tem, sim, que ser responsabilizado civilmente para ser responsável
financeiro", afirmou.
Lucia Rincon, do CNDM, diz que a ideia de fazer com que a mulher vítima de estupro conviva com seu agressor é contra a lei. "(O projeto)
desconsidera a situação da agressão, da violência sofrida, instituindo a
manutenção econômica, dizendo ao perpetuador da violência sexual que
ele possa arcar com a manutenção econômica da criança. A mulher tem
horror, tem traumas, e vai ter que colocar (o nome do agressor)
na certidão de nascimento de seu filho, vai ter que ir atrás dele. Isso
é uma crueldade com as mulheres, é ignorar a situação real de vida das
pessoas."
A proposta foi aprovada na quarta-feira pela Comissão de Finanças e
Tributação da Câmara, e já havia sido aprovado pela Comissão de
Seguridade Social e Família. Agora, o texto segue para análise da
Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) - se for aprovado, ele irá a
votação em plenário.
|