A sigla LGBT foi criada para abranger lésbicas, gays,
bissexuais e transgêneros. Era de se esperar que cada um ficasse no seu
quadrado, respeitando a orientação sexual dos outros. Só que não é bem
assim que acontece. Dentro da própria comunidade LGBT, os bissexuais
podem ser considerados o "patinho feio". Sua versatilidade muitas vezes é
vista como indefinição, e por isso eles têm menos credibilidade e
sofrem preconceito dos LGT.
Mas, afinal, qual é o problema em sentir atração tanto por homens
quanto por mulheres? “As pessoas falam que é temporário, que é uma
fase, até eu conseguir me decidir. Não entendem que essa é a minha
sexualidade", reclama o redator Leonardo Villela Araujo, 25. "Tem homens
que se atraem por mulheres, outros por homens, porque eu não posso me
atrair pelos dois?”
Leonardo conta que ainda criança, aos 11 anos, ele percebeu
que achava graça tanto nos meninos quanto nas meninas. Mesmo tendo
tomado consciência de sua bissexualidade muito cedo, só teve qualquer
contato com outro homem
aos 17 anos. Ele já namorou mulheres e homens e diz que o gênero do
parceiro não importa, mas acha mais difícil se relacionar com as
mulheres.
“Em primeiro lugar, tem o fato de as mulheres serem muito machistas, o
que me incomoda muito. Em segundo vem a insegurança, já que elas pensam
que vou trocá-las por um homem a qualquer momento. Quando o
relacionamento acaba, a mulher raramente entende que é porque não estou
mais interessado nela como pessoa, e não porque ela é mulher”, desabafa.
A dificuldade de compreensão da bissexualidade também causa
frustração na publicitária Dani Cruz, 27, que afirma sofrer muito
preconceito. “As amigas lésbicas falam que eu sou hétero, só porque hoje
eu namoro um homem, o que me ofende bastante. Em contrapartida, os
homens héteros acham que, porque sou bi, vou querer trair meu namorado
com uma menina, ou que fazemos altos ménages”.
"Os amigos gays vibram quando saio com meninas e riem quando saio com meninos"
Dani afirma que é difícil para quem não é bissexual entender que a
bissexualidade não é uma escolha ou algo mutável. ”Eu gosto de meninas e
meninos. Não é porque namoro um que vou trair com o outro, não viro
hétero quando namoro um homem e nem viro lésbica quando namoro uma
menina”, explica ela, que já terminou relacionamentos porque namorados e
namoradas disseram “não aguentar a pressão”.
Já a estudante Carolina de Oliveira Tsuda, 23, conta que nunca teve
problema com seus relacionamentos e que o preconceito maior vem por
parte dos amigos gays. “Tenho muitos amigos gays que vibram quando eu
saio com uma menina e que riem quando eu saio com um menino. Eles falam
na brincadeira, mas é um tipo de preconceito”.
Para Leonardo, parte da confusão acontece porque muitos gays têm um
período em que percebem o interesse por pessoas do mesmo sexo e não
descartam o interesse pelo sexo oposto, e aí imaginam que se enquadram
na categoria bissexual, até perceber sua verdadeira orientação. Ou que
simplesmente acham mais simples assumir que são bissexuais.
“Quando jovens, muitos afirmam ser bissexuais como uma ‘estratégia’
para se assumir, ou para se liberar para relações com pessoas do mesmo
sexo. Às vezes isso se confirma, mas é preciso lembrar que durante a
adolescência toda a questão relacionada ao sexo é confusa, as
referências ainda são limitadas. O jovem que está entendendo sua
sexualidade pode se sentir atraído por ambos os sexos.”
Dani conta que o mesmo acontece com as meninas. “Eu nunca precisei me
aceitar, mas sei que se colocar como bi é uma alternativa para não se
assumir completamente. E ok, afinal existe um medo muito grande de se
assumir, até pra si mesmo”, lembra ela. "Esse processo faz com que os
bissexuais sofram preconceito. Um monte de gente acha que é uma fase
passageira, ou uma falta de tomada de posição."
A falta do pênis
Outra questão que sempre vem à tona com relação aos bissexuais é o
sexo. Será que uma menina bi vai sentir falta do pênis quando transar
com outra menina? E que um menino bi vai se satisfazer com uma vagina
quando estiver transando com uma mulher? Eles vão ter que ir atrás da
compensação do sexo que ficou faltando?
Dani conta que quando está com alguém ela se entrega, e essa pessoa, homem ou mulher, passa então a suprir suas necessidades.
“Não acontece de ficar com alguém de um sexo desejando estar com outro.
Vale lembrar que várias meninas gays usam vibradores e consolos também.
Gostar de penetração não é uma característica só das mulheres
bissexuais."
Em relação aos homens bissexuais, Leonardo conta que a maior
preocupação das parceiras do sexo feminino é também a penetração. “As
meninas pensam: ‘Meu Deus, eu não tenho como fazer sexo com ele! Ele
gosta de transar com homens, de ser passivo fazendo sexo anal’”. A
menina bi, por sua vez, está envolta em um fetiche masculino. "Quando um
cara pega uma menina que fala que é bi, ele já pensa: 'Vou poder
transar com duas meninas ao mesmo tempo’", diz Leonardo.
Mas as coisas estão mudando aos poucos, e o trio é esperançoso quanto
ao futuro dos bissexuais. “As pessoas têm se aberto para novas
experiências. Já é mais socialmente aceito ficar com alguém do mesmo
sexo, nem que seja só para experimentar. Antigamente isso era um tabu”,
aposta Dani.